Pular para o conteúdo principal

Circunstancias x Caráter

A nossa vida, como repertório de possibilidades, é magnífica, exuberante, superior a todas as historicamente conhecidas. Mas assim como o seu formato é maior, transbordou todos os caminhos, princípios, normas e ideais legados pela tradição. É mais vida que todas as vidas, e por isso mesmo mais problemática. Não pode orientar-se no pretérito. Tem de inventar o seu próprio destino. Mas agora é preciso completar o diagnóstico. A vida, que é, antes de tudo, o que podemos ser, vida possível, é também, e por isso mesmo, decidir entre as possibilidades o que em efeito vamos ser. Circunstâncias e decisão são os dois elementos radicais de que se compõe a vida. A circunstância – as possibilidades – é o que da nossa vida nos é dado e imposto. Isso constitui o que chamamos o mundo. A vida não elege o seu mundo, mas viver é encontrar-se, imediatamente, em um mundo determinado e insubstituível: neste de agora. O nosso mundo é a dimensão de fatalidade que integra a nossa vida. Mas esta fatalidade vital não se parece à mecânica. Não somos arremessados para a existência como a bala de um fuzil, cuja trajetória está absolutamente pré-determinada. A fatalidade em que caímos ao cair neste mundo – o mundo é sempre este, este de agora – consiste em todo o contrário. Em vez de impor-nos uma trajetória, impõe-nos várias e, consequentemente, força-nos... a eleger. Surpreendente condição a da nossa vida! Viver é sentir-se fatalmente forçado a exercitar a liberdade, a decidir o que vamos ser neste mundo. Nem um só instante se deixa descansar a nossa atividade de decisão. Inclusive quando desesperados nos abandonamos ao que queira vir, decidimos não decidir. É, pois, falso dizer que na vida «decidem as circunstâncias». Pelo contrário: as circunstâncias são o dilema, sempre novo, ante o qual temos de nos decidir. Mas quem decide é o nosso carácter.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Lúcido é quem sente

Sentir é criar. Sentir é pensar sem ideias, e por isso sentir é compreender, visto que o Universo não tem ideias. - Mas o que é sentir? Ter opiniões é não sentir. Todas as nossas opiniões são dos outros. Pensar é querer transmitir aos outros aquilo que se julga que se sente. Só o que se pensa é que se pode comunicar aos outros. O que se sente não se pode comunicar. Só se pode comunicar o valor do que se sente. Só se pode fazer sentir o que se sente. Não que o leitor sinta a pena comum [?]. Basta que sinta da mesma maneira. O sentimento abre as portas da prisão com que o pensamento fecha a alma. A lucidez só deve chegar ao limiar da alma. Nas próprias antecâmaras é proibido ser explícito. Sentir é compreender. Pensar é errar. Compreender o que outra pessoa pensa é discordar dela. Compreender o que outra pessoa sente é ser ela. Ser outra pessoa é de uma grande utilidade metafísica. Deus é toda a gente. Ver, ouvir, cheirar, gostar, palpar - são os únicos mandamentos da lei de De

Sobrevida

Gosto de olhar pro céu e esquecer da terra Esquecer da maldade, da falta de amizade Fazer as coisas sem motivo e ter raros momentos pra pensar Lembrar dos amigos e rir das boas lembranças Das mágoas não chorar ter força e não mudar O meu caminho eu sigo minha imagem eu faço só não posso esperar mais Eu vou embora, quero ter coragem Pra isso e algo mais Quero ter coragem Quero ter coragem e nada mais